Capítulo 1
Mais um dia no trabalho, um monótono e cansativo trabalho. Nunca soube ao certo quem eram os meus patrões, só que eram ricos o bastante para me dar um salário que qualquer secretária agradeceria de joelhos, mais a moradia numa casa esplêndida ao Sul de uma cidade no interior da Amazônia, no alto de uma grande montanha, bem no meio de uma floresta repleta de árvores centenárias. Ok, eu não sou louca de me afastar do mundo, com desconhecidos só pelo salário de executivo de multinacional, ou eu sou ?
Me peguei olhando atentamente para uma das poucas janelas da propriedade, uma pena, já que a vista era maravilhosa, a chuva batia violentamente contra a janela, e as árvores balançavam de uma forma que era quase inacreditável elas não terem partido no meio. Estava pensando em como vim parar aqui, e essa não foi a primeira, nem segunda, nem septuagésima vez que isso aconteceu.
Fui criada pela Vó Almira,o por que não sei, mas minha mãe desapareceu e me deixou só em casa por dias, eu tinha quatro anos. Vó sentiu minha falta e me achou em casa, com a porta encostada e eu dormindo agarrada em uma das calças jeans que mamãe havia deixado, fiz minha comida, ou melhor comi biscoito e tomei água até não ter mais nada pra comer, eu não saí de casa por ordens da mamãe, ela sempre me disse que não saísse sozinha por aí, então não o fiz. Passaram-se dias, não me lembro quantos.
E você pensa: Oh que peninha da criança largada pela mãe!
Não, nada disso!
Nunca me senti assim e não aceito que sintam pena de mim, afinal isso não é nada. Vovó Almira cuidou de mim até morrer, quando tinha seus 76 anos, de uma doença que nunca conseguimos descobrir, eu tinha dezessete anos e me vi sem ninguém, aí sim eu senti medo. Era uma noite quente de agosto, vovó fez tudo como sempre, uma janta boa com uma sobremesa melhor que nunca, disse que estava com dores no corpo, como sempre, e foi dormir. E não acordou mais.
Na manhã seguinte tive que cuidar de mim mesma. E do funeral. Não tínhamos muito mas ela me deixou a casa, uma poupança suficiente para uns meses e Yoshi, o cachorro mais estranho do mundo. Sim! Minha vó jogava Mário, nós fizemos uma poupança pra comprar um vídeo game, e ela jogava pra me fazer companhia, e depois de um tempo ela me ganhava... Sempre gostamos muito de Super Mário, e daí veio o nome do tal cachorro. Ele me ama e me odeia, costumava me odiar, mas aqui, nessa casa ele me ama como nunca, realmente não o entendo.
E a chuva continuava, só que mais mansamente,e eu queria agora estar lá fora, queria correr na chuva pelada... é pelada não. Mas correr na chuva, sentir o gosto de chuva, o cheiro delicioso de terra molhada exalando ao meu redor. Estava muito absorta nos pensamentos que despertei com uma bolinha de papel no meu rosto, estava pronta para uma boa resposta, um dos meus mais fortes poderes.
-Hey sonha sonha da Estrela, tá na hora de trabalhar!
Abri a boca mas parei instantaneamente quando vi os olhos extremamente pretos de Adam que me olhavam com um ar pseudo engraçado. Ele era um dos filhos do dono daqui, era bonito, mas o jeitinho de me olhar como se fosse uma barata, me fazia odiá-lo
Barata? Ah faça-me o favor! Odeio barata.
Era alto acho que um metro e oitenta, branco demais, com olhos e cabelos muito pretos, suas feições eram finas, era um grande atrativo, mas o físico era melhor, bem melhor, além de alto era forte, muito forte, e acima de tudo tinha uma bunda linda. E seu sotaque estranho o deixava muito atraente para os olhos e ouvidos, tanto de frente quanto de costas.
-Oi Adam, o que tu falou?
-Ah! O uso do pronome respeitável é só para o meu pai?
-Não exatamente, uso quando a quem me refiro merece o uso do pronome respeitável.
Me levantei recolhendo as pastas pretas e me preparando para uma das coisas mais estranhas e desconfortáveis da minha vida, as reuniões de família.
-Uh! Essa pegou bem no peito, ó grande e respeitável secretária.
-Hahaha. Engraçado como sempre, que horas são?
-hã?
-Que horas são por favor?
-Muito bem, está quase domada, é tarde, muito tarde.
Ele falava rindo, como isso me irrita meu Deus!
-Obrigada Adam, mas acho que se eu estou atrasada, você tá muito mais, ó grande herdeiro. – fiz questão de fazer uma grande reverencia bem na frente dele, senti que ele se sentiu muito bem com isso “Que palerma” eu pensei.
Abri uma pesada porta de madeira escura um pouco atrás da minha mesa, deixei Adam passar primeiro, ele riu e piscou pra mim, eu vendo que todos olhavam pra porta apenas dei um pequeno sorriso meigo e balancei a cabeça. Esses todos eram muito estranhos.
“Estranhamente bonitos” é simplesmente impossível haver uma família assim, eu já tinha cogitado a ideia de uma família geneticamente modificada, com os filhos de proveta, mas não devia ser isso de fato, muito menos as outras opções como kriptonita, dejetos radioativos, ou qualquer coisa do tipo.
Entrei na sala de reuniões, era um cômodo amplo, muito refinado. Tinha no centro uma mesa da mesma madeira da porta em formato oval, no teto um candelabro de cristais que em vez de velas tinha lâmpadas que tentavam, e conseguiam, imitar velas. Nas paredes de madeira estavam pendurados quadros das gerações passadas, mas tão passadas que acho que eram do tempo onde não tinha máquina fotográfica.
Numa mesinha embaixo do retrato mais assustador que já vi – um homem alto, com cabelos muito negros presos num rabo de cavalo, com uma mecha caindo na testaestava um pequeno retrato dessa família onde parecia ser a Europa. Os filhos ainda eram pequenos e Adam parecia um anjo, essa é a prova de que fotos não dizem absolutamente nada! E no que eu acho que é a cabeceira da mesa estava Sr. Gilberto, o patriarca da rica e estranha família Deleon.
-Boa noite senhores.
-Boa noite Lívia, a senhorita está de fato alguns minutos atrasada. –disse de um jeito educado porém duro, o que me fez gelar.
-Me desculpe senhor, é que tive alguns imprevistos. – fiz questão de olhar de canto para Adam, mesmo ele não sendo o culpado por meus devaneios anteriores.
-Ah, entendo. -Disse Sr. Gilberto entendendo meu recado. –Meu filho faz questão de ser perturbador as vezes.
-O senhor não sabe quanto! –Os membros da família riram, Adam fez uma cara de surpreso, puro sarcasmo, Thaís, branca, loira, de olhos castanhos escuro e cabelo enrolado de um jeito muito indeciso e difícil de domar, foi a única que não havia expressado outro sentimento senão desgosto e desdém. Ela é sempre assim, parece que sempre tem alguma coisa fedendo por perto, ou que sempre sente dor. Ela é extremamente estranha. Não vou com a cara dela, e quando eu estou em período s de raiva profunda, me pego sonhando com vários modos de matá-la, torturá-la e coisas do tipo, mas só em alguns dias do mês...
-Bem, vamos começar logo essa reunião por que Rachel e eu temos que viajar a trabalho. -Disse o patriarca
O meu trabalho era só anotar e fazer com que todos cumpram as ordens deixadas.
-Enquanto estivermos fora, não haverá nenhum tipo de saídas enquanto o Sol estiver no céu, e depois vocês sabem que podem sair contanto que hajam com responsabilidade. Adam, gostaria que você parasse de agir como um adolescente retardado. –Rachel falou com uma voz imponente, como uma mãe fala com seus filhos.
-Difícil! –A outra irmã disse com um sorrisinho no rosto, Monica é irmã gêmea de Adam, branca, alta, olhos negros e cabelos tão pretos quanto a penumbra no meio da floresta, lisos como o de uma índia. Tinha um humor muito igual ao meu, sarcástico e descontraído. –Ele sempre vai ser um retardado, não importa a idade que ele tenha.
-Monica! –Disse Rachel
-Deixa quieto mãe, eu sou o mais velho dos dois, então ela tem que me respeitar.
Uma risada monumental ecoou pela sala, me assustei pacas, olhei para o lado e vi Monica rindo segurando a cabeça e o peito. Ela parou bruscamente colocou as duas mãos na mesa e se levantou, olhando ameaçadoramente para Adam. E ele não negando os mesmos genes fez o mesmo. Seus rostos ficaram a centímetros um do outro.
-Em que aspecto você é mais velho? Aposto que eu sou a mais forte dos dois.
-E eu aposto o contrário.
-Duvido!
-Vai ver que tá errada em breve.
A cada palavra eles se aproximavam mais.
-Depende de qual nascimento está falando meu caro!
-Monica! Sente-se! –O pai batei o punho na mesa. –Adam! Porte-se como um homem!
Os dois permaneceram mais uns segundos se encarando então, começaram a rir, e Monica deu um beijo muito carinhoso em Adam que devolveu o gesto com uma piscadela característica dele. Cada um caiu em sua poltrona de um jeito desleixado, muito diferente da postura da outra irmã.
Acho que ela é adotada, adoraria descobrir isso e fazê-la sofrer ... Prendi uma gargalhada maligna, mas apenas deixei a tensão daquela coisa que tinha acontecido antes desaparecer com a reação de ambos.
-Vamos continuar com isso logo, que tenho mais o que fazer do que ver esse showzinho de valentia dos gêmeos. –Falou a chata.
-Hahaha, mais o que fazer... tipo ficar tentando alisar essa juba?-Adam pegou no ponto fraco de Thais, ela odeia ter o cabelo que tem, se fosse ela também odiaria, mas acho bom ver ela lá sem graça com o comentário do irmão, não que o embaraço que ela sentia tivesse transparecido por um milésimo de segundo, mas eu sei que dentro dela tem uma miniThais pulando e arrancando o cabelo de raiva, isso me deixa mais leve.
-Cala a boca seu idiota!-Disse a mal amada Thais.
-Parou todos vocês! Vocês já são velhos o bastante pra ficarem com essas discussões sem sentido. –A mãe falou se levantando, e sendo acompanhada pelo pai. – Eu cansei dessas brincadeirinhas sem graça, todos os privilégios de vocês estão cortados, sem passeios noturnos enquanto estivermos fora, quando chegar penso no que fazer com vocês.
Os três irmãos ficaram calados, como filhos ficam quando surpreendidos pelas mães. Adam ainda parecia o mais disposto a abrir uma discussão naquele momento, ameaçou a abrir a boca, mas rapidamente a mãe levantou a mão esquerda em um sinal de alerta, ele parou bruscamente fazendo cara feia. Os chefes de família saíram da sala.
-Droga! Vocês só atrapalham a minha vida! Eu tinha planejado umas coisas e agora foi tudo pro ralo! Gêmeos imbecis.
Thais atirava suas palavras de um jeito muito agressivo e perverso. Seus olhos castanhos pareciam vermelhos agora, forcei-me a piscar algumas vezes e a ilusão não sumia, notando a minha confusão Monica solta um grito agudo demais, fechei os olhos e pus a mão no ouvido, Adam que discutia com a irmã soltou um xingamento alto, e Thais parou abruptamente, ultrajada tanto pelas palavras de Adam quanto pela violação de seus timpanos, a bruxinha fechou os olhos, arrumou a roupa, respirou fundo e saiu da sala batendo os pés com mais força do que o necessário.
-Que merda Monica! Já falei pra não gritar desse jeito quando eu to perto, sabe que minha audição é melhor do que a de vocês!
-Você sabe que isso foi necessário, essa menina tá cada vez mais perturbada, não nega que é sua irmã...
-E tu não nega que é minha gêmea, né?
-Pior que não mesmo – Ambos riram e Adam percebeu que eu estava vendo tudo.
-Hey Lívia, quer dar uma volta no meu carro novo? Ele acabou de chegar, tenho que estrear!
-Você não vai a lugar nenhum, tenho ordens expressas de impedir suas infantilidades Adam.
-Uh! Você acaba comigo coração! Como se você pudesse me impedir de fazer alguma coisa.
-E eu sou, não tenho tempo pra ficar vendo você se achar o maior, e o melhor, sendo que nem mais velho é.
-Hey garota, gostei de ti. –Monica veio sorridente pro meu lado, e como eu gostava do jeito dela, retribui o sorriso. – Que horas você “sai” do trabalho?- ela fez questão de colocar o sair entre aspas.
-Tecnicamente, em 4 minutos, mas tenho que arrumar algumas coisas, mas acho que termino tudo em meia hora, por que?
-Ah, por que queria companhia pra um drink, já que sair de casa, eu não posso...
-Drink? Eu não bebo no trabalho.- falei - Mas queria - pensei.
-Eu sei que você quer.- Disse Adam me olhando.
-Você não sabe de nada garoto!
-Eu sei de tudo. E eu sou mais velho que você.
-Me parece que você sempre precisa ser mais velho, por que? Tem medo de ser feito de bobo?
-Ok ok! Tá bom vocês dois! Nem namorados vocês são, mas essa enrolação é um chute nas bolas... não que eu tenha bolas, é claro.
Fiz uma careta pensando na ideia de ver Monica com bolas... era hilário e ao mesmo tempo perturbador, até demais para o meu gosto. Adam riu e disse:-Não atice a imaginação dessa garota, aposto um milhão que ela te imaginou com bolas.
Oh Meu Deus! Não acredito que ele disse isso, provavelmente nós temos a mesma idade, mas aqui, eles são patrões e eu empregada, nem deveria estar conversando assim ...
-Não! Sério Lívia?
-Er ... falando a verdade, eu imaginei sim, mas foi rapidinho.
-E como fiquei? – Monica fez como se estivesse segurando as suas “bolas”- Fiquei linda com bolas?
-Não posso negar, que para quem gosta de coisas peculiares, você era atraente.
Rimos.
-Bem, eu tenho que trabalhar boa noite a todos, e espero que não inflijam as regras.
-Mas eu venho te pegar as 8, esteja pronta pra um drink, um filme e alguns jogos.-Disse a animada Monica.
Ok. Que jogos? Poker? Strip Poker? Dama? Porrinha? Roleta russa?
-Que jogos?
-Banco imobiliário. Pensava em algo mais interessante?
-Acho que ela pensou em strip poker.
Mas que merda, esse menino sabe tudo o que eu penso, ou ele pensa tanta besteira quanto eu?
-Adam, engraçado como sempre. Se for pra ficar de olho em vocês eu topo uns jogos. - respondi mais animada do que eu esperava. Era estranho saber que eu sentia falta de ter pessoas da minha idade, sentia falta de pelo menos ter pessoas para conversar.-Estarei pronta as 8 horas, Agora se não for incomodar eu gostaria de dar uma arrumada nisso aqui.
Os dois assentiram com a cabeça e saíram. Essa ia ser uma coisa engraçada, pelo menos era por isso que eu torcia.
Mais um dia no trabalho, um monótono e cansativo trabalho. Nunca soube ao certo quem eram os meus patrões, só que eram ricos o bastante para me dar um salário que qualquer secretária agradeceria de joelhos, mais a moradia numa casa esplêndida ao Sul de uma cidade no interior da Amazônia, no alto de uma grande montanha, bem no meio de uma floresta repleta de árvores centenárias. Ok, eu não sou louca de me afastar do mundo, com desconhecidos só pelo salário de executivo de multinacional, ou eu sou ?
Me peguei olhando atentamente para uma das poucas janelas da propriedade, uma pena, já que a vista era maravilhosa, a chuva batia violentamente contra a janela, e as árvores balançavam de uma forma que era quase inacreditável elas não terem partido no meio. Estava pensando em como vim parar aqui, e essa não foi a primeira, nem segunda, nem septuagésima vez que isso aconteceu.
Fui criada pela Vó Almira,o por que não sei, mas minha mãe desapareceu e me deixou só em casa por dias, eu tinha quatro anos. Vó sentiu minha falta e me achou em casa, com a porta encostada e eu dormindo agarrada em uma das calças jeans que mamãe havia deixado, fiz minha comida, ou melhor comi biscoito e tomei água até não ter mais nada pra comer, eu não saí de casa por ordens da mamãe, ela sempre me disse que não saísse sozinha por aí, então não o fiz. Passaram-se dias, não me lembro quantos.
E você pensa: Oh que peninha da criança largada pela mãe!
Não, nada disso!
Nunca me senti assim e não aceito que sintam pena de mim, afinal isso não é nada. Vovó Almira cuidou de mim até morrer, quando tinha seus 76 anos, de uma doença que nunca conseguimos descobrir, eu tinha dezessete anos e me vi sem ninguém, aí sim eu senti medo. Era uma noite quente de agosto, vovó fez tudo como sempre, uma janta boa com uma sobremesa melhor que nunca, disse que estava com dores no corpo, como sempre, e foi dormir. E não acordou mais.
Na manhã seguinte tive que cuidar de mim mesma. E do funeral. Não tínhamos muito mas ela me deixou a casa, uma poupança suficiente para uns meses e Yoshi, o cachorro mais estranho do mundo. Sim! Minha vó jogava Mário, nós fizemos uma poupança pra comprar um vídeo game, e ela jogava pra me fazer companhia, e depois de um tempo ela me ganhava... Sempre gostamos muito de Super Mário, e daí veio o nome do tal cachorro. Ele me ama e me odeia, costumava me odiar, mas aqui, nessa casa ele me ama como nunca, realmente não o entendo.
E a chuva continuava, só que mais mansamente,e eu queria agora estar lá fora, queria correr na chuva pelada... é pelada não. Mas correr na chuva, sentir o gosto de chuva, o cheiro delicioso de terra molhada exalando ao meu redor. Estava muito absorta nos pensamentos que despertei com uma bolinha de papel no meu rosto, estava pronta para uma boa resposta, um dos meus mais fortes poderes.
-Hey sonha sonha da Estrela, tá na hora de trabalhar!
Abri a boca mas parei instantaneamente quando vi os olhos extremamente pretos de Adam que me olhavam com um ar pseudo engraçado. Ele era um dos filhos do dono daqui, era bonito, mas o jeitinho de me olhar como se fosse uma barata, me fazia odiá-lo
Barata? Ah faça-me o favor! Odeio barata.
Era alto acho que um metro e oitenta, branco demais, com olhos e cabelos muito pretos, suas feições eram finas, era um grande atrativo, mas o físico era melhor, bem melhor, além de alto era forte, muito forte, e acima de tudo tinha uma bunda linda. E seu sotaque estranho o deixava muito atraente para os olhos e ouvidos, tanto de frente quanto de costas.
-Oi Adam, o que tu falou?
-Ah! O uso do pronome respeitável é só para o meu pai?
-Não exatamente, uso quando a quem me refiro merece o uso do pronome respeitável.
Me levantei recolhendo as pastas pretas e me preparando para uma das coisas mais estranhas e desconfortáveis da minha vida, as reuniões de família.
-Uh! Essa pegou bem no peito, ó grande e respeitável secretária.
-Hahaha. Engraçado como sempre, que horas são?
-hã?
-Que horas são por favor?
-Muito bem, está quase domada, é tarde, muito tarde.
Ele falava rindo, como isso me irrita meu Deus!
-Obrigada Adam, mas acho que se eu estou atrasada, você tá muito mais, ó grande herdeiro. – fiz questão de fazer uma grande reverencia bem na frente dele, senti que ele se sentiu muito bem com isso “Que palerma” eu pensei.
Abri uma pesada porta de madeira escura um pouco atrás da minha mesa, deixei Adam passar primeiro, ele riu e piscou pra mim, eu vendo que todos olhavam pra porta apenas dei um pequeno sorriso meigo e balancei a cabeça. Esses todos eram muito estranhos.
“Estranhamente bonitos” é simplesmente impossível haver uma família assim, eu já tinha cogitado a ideia de uma família geneticamente modificada, com os filhos de proveta, mas não devia ser isso de fato, muito menos as outras opções como kriptonita, dejetos radioativos, ou qualquer coisa do tipo.
Entrei na sala de reuniões, era um cômodo amplo, muito refinado. Tinha no centro uma mesa da mesma madeira da porta em formato oval, no teto um candelabro de cristais que em vez de velas tinha lâmpadas que tentavam, e conseguiam, imitar velas. Nas paredes de madeira estavam pendurados quadros das gerações passadas, mas tão passadas que acho que eram do tempo onde não tinha máquina fotográfica.
Numa mesinha embaixo do retrato mais assustador que já vi – um homem alto, com cabelos muito negros presos num rabo de cavalo, com uma mecha caindo na testaestava um pequeno retrato dessa família onde parecia ser a Europa. Os filhos ainda eram pequenos e Adam parecia um anjo, essa é a prova de que fotos não dizem absolutamente nada! E no que eu acho que é a cabeceira da mesa estava Sr. Gilberto, o patriarca da rica e estranha família Deleon.
-Boa noite senhores.
-Boa noite Lívia, a senhorita está de fato alguns minutos atrasada. –disse de um jeito educado porém duro, o que me fez gelar.
-Me desculpe senhor, é que tive alguns imprevistos. – fiz questão de olhar de canto para Adam, mesmo ele não sendo o culpado por meus devaneios anteriores.
-Ah, entendo. -Disse Sr. Gilberto entendendo meu recado. –Meu filho faz questão de ser perturbador as vezes.
-O senhor não sabe quanto! –Os membros da família riram, Adam fez uma cara de surpreso, puro sarcasmo, Thaís, branca, loira, de olhos castanhos escuro e cabelo enrolado de um jeito muito indeciso e difícil de domar, foi a única que não havia expressado outro sentimento senão desgosto e desdém. Ela é sempre assim, parece que sempre tem alguma coisa fedendo por perto, ou que sempre sente dor. Ela é extremamente estranha. Não vou com a cara dela, e quando eu estou em período s de raiva profunda, me pego sonhando com vários modos de matá-la, torturá-la e coisas do tipo, mas só em alguns dias do mês...
-Bem, vamos começar logo essa reunião por que Rachel e eu temos que viajar a trabalho. -Disse o patriarca
O meu trabalho era só anotar e fazer com que todos cumpram as ordens deixadas.
-Enquanto estivermos fora, não haverá nenhum tipo de saídas enquanto o Sol estiver no céu, e depois vocês sabem que podem sair contanto que hajam com responsabilidade. Adam, gostaria que você parasse de agir como um adolescente retardado. –Rachel falou com uma voz imponente, como uma mãe fala com seus filhos.
-Difícil! –A outra irmã disse com um sorrisinho no rosto, Monica é irmã gêmea de Adam, branca, alta, olhos negros e cabelos tão pretos quanto a penumbra no meio da floresta, lisos como o de uma índia. Tinha um humor muito igual ao meu, sarcástico e descontraído. –Ele sempre vai ser um retardado, não importa a idade que ele tenha.
-Monica! –Disse Rachel
-Deixa quieto mãe, eu sou o mais velho dos dois, então ela tem que me respeitar.
Uma risada monumental ecoou pela sala, me assustei pacas, olhei para o lado e vi Monica rindo segurando a cabeça e o peito. Ela parou bruscamente colocou as duas mãos na mesa e se levantou, olhando ameaçadoramente para Adam. E ele não negando os mesmos genes fez o mesmo. Seus rostos ficaram a centímetros um do outro.
-Em que aspecto você é mais velho? Aposto que eu sou a mais forte dos dois.
-E eu aposto o contrário.
-Duvido!
-Vai ver que tá errada em breve.
A cada palavra eles se aproximavam mais.
-Depende de qual nascimento está falando meu caro!
-Monica! Sente-se! –O pai batei o punho na mesa. –Adam! Porte-se como um homem!
Os dois permaneceram mais uns segundos se encarando então, começaram a rir, e Monica deu um beijo muito carinhoso em Adam que devolveu o gesto com uma piscadela característica dele. Cada um caiu em sua poltrona de um jeito desleixado, muito diferente da postura da outra irmã.
Acho que ela é adotada, adoraria descobrir isso e fazê-la sofrer ... Prendi uma gargalhada maligna, mas apenas deixei a tensão daquela coisa que tinha acontecido antes desaparecer com a reação de ambos.
-Vamos continuar com isso logo, que tenho mais o que fazer do que ver esse showzinho de valentia dos gêmeos. –Falou a chata.
-Hahaha, mais o que fazer... tipo ficar tentando alisar essa juba?-Adam pegou no ponto fraco de Thais, ela odeia ter o cabelo que tem, se fosse ela também odiaria, mas acho bom ver ela lá sem graça com o comentário do irmão, não que o embaraço que ela sentia tivesse transparecido por um milésimo de segundo, mas eu sei que dentro dela tem uma miniThais pulando e arrancando o cabelo de raiva, isso me deixa mais leve.
-Cala a boca seu idiota!-Disse a mal amada Thais.
-Parou todos vocês! Vocês já são velhos o bastante pra ficarem com essas discussões sem sentido. –A mãe falou se levantando, e sendo acompanhada pelo pai. – Eu cansei dessas brincadeirinhas sem graça, todos os privilégios de vocês estão cortados, sem passeios noturnos enquanto estivermos fora, quando chegar penso no que fazer com vocês.
Os três irmãos ficaram calados, como filhos ficam quando surpreendidos pelas mães. Adam ainda parecia o mais disposto a abrir uma discussão naquele momento, ameaçou a abrir a boca, mas rapidamente a mãe levantou a mão esquerda em um sinal de alerta, ele parou bruscamente fazendo cara feia. Os chefes de família saíram da sala.
-Droga! Vocês só atrapalham a minha vida! Eu tinha planejado umas coisas e agora foi tudo pro ralo! Gêmeos imbecis.
Thais atirava suas palavras de um jeito muito agressivo e perverso. Seus olhos castanhos pareciam vermelhos agora, forcei-me a piscar algumas vezes e a ilusão não sumia, notando a minha confusão Monica solta um grito agudo demais, fechei os olhos e pus a mão no ouvido, Adam que discutia com a irmã soltou um xingamento alto, e Thais parou abruptamente, ultrajada tanto pelas palavras de Adam quanto pela violação de seus timpanos, a bruxinha fechou os olhos, arrumou a roupa, respirou fundo e saiu da sala batendo os pés com mais força do que o necessário.
-Que merda Monica! Já falei pra não gritar desse jeito quando eu to perto, sabe que minha audição é melhor do que a de vocês!
-Você sabe que isso foi necessário, essa menina tá cada vez mais perturbada, não nega que é sua irmã...
-E tu não nega que é minha gêmea, né?
-Pior que não mesmo – Ambos riram e Adam percebeu que eu estava vendo tudo.
-Hey Lívia, quer dar uma volta no meu carro novo? Ele acabou de chegar, tenho que estrear!
-Você não vai a lugar nenhum, tenho ordens expressas de impedir suas infantilidades Adam.
-Uh! Você acaba comigo coração! Como se você pudesse me impedir de fazer alguma coisa.
-E eu sou, não tenho tempo pra ficar vendo você se achar o maior, e o melhor, sendo que nem mais velho é.
-Hey garota, gostei de ti. –Monica veio sorridente pro meu lado, e como eu gostava do jeito dela, retribui o sorriso. – Que horas você “sai” do trabalho?- ela fez questão de colocar o sair entre aspas.
-Tecnicamente, em 4 minutos, mas tenho que arrumar algumas coisas, mas acho que termino tudo em meia hora, por que?
-Ah, por que queria companhia pra um drink, já que sair de casa, eu não posso...
-Drink? Eu não bebo no trabalho.- falei - Mas queria - pensei.
-Eu sei que você quer.- Disse Adam me olhando.
-Você não sabe de nada garoto!
-Eu sei de tudo. E eu sou mais velho que você.
-Me parece que você sempre precisa ser mais velho, por que? Tem medo de ser feito de bobo?
-Ok ok! Tá bom vocês dois! Nem namorados vocês são, mas essa enrolação é um chute nas bolas... não que eu tenha bolas, é claro.
Fiz uma careta pensando na ideia de ver Monica com bolas... era hilário e ao mesmo tempo perturbador, até demais para o meu gosto. Adam riu e disse:-Não atice a imaginação dessa garota, aposto um milhão que ela te imaginou com bolas.
Oh Meu Deus! Não acredito que ele disse isso, provavelmente nós temos a mesma idade, mas aqui, eles são patrões e eu empregada, nem deveria estar conversando assim ...
-Não! Sério Lívia?
-Er ... falando a verdade, eu imaginei sim, mas foi rapidinho.
-E como fiquei? – Monica fez como se estivesse segurando as suas “bolas”- Fiquei linda com bolas?
-Não posso negar, que para quem gosta de coisas peculiares, você era atraente.
Rimos.
-Bem, eu tenho que trabalhar boa noite a todos, e espero que não inflijam as regras.
-Mas eu venho te pegar as 8, esteja pronta pra um drink, um filme e alguns jogos.-Disse a animada Monica.
Ok. Que jogos? Poker? Strip Poker? Dama? Porrinha? Roleta russa?
-Que jogos?
-Banco imobiliário. Pensava em algo mais interessante?
-Acho que ela pensou em strip poker.
Mas que merda, esse menino sabe tudo o que eu penso, ou ele pensa tanta besteira quanto eu?
-Adam, engraçado como sempre. Se for pra ficar de olho em vocês eu topo uns jogos. - respondi mais animada do que eu esperava. Era estranho saber que eu sentia falta de ter pessoas da minha idade, sentia falta de pelo menos ter pessoas para conversar.-Estarei pronta as 8 horas, Agora se não for incomodar eu gostaria de dar uma arrumada nisso aqui.
Os dois assentiram com a cabeça e saíram. Essa ia ser uma coisa engraçada, pelo menos era por isso que eu torcia.
